Imagine tentar entender uma história antiga apenas observando as pegadas deixadas na areia. Cada pegada conta uma parte da jornada, mas juntas, elas podem revelar detalhes sobre quem veio antes, como se moveram e onde estavam. É exatamente assim que os cientistas estão agora descobrindo a origem dos buracos negros, usando uma ferramenta que funciona como uma espécie de “impressão digital” cósmica: as ondas gravitacionais.
Você já deve ter ouvido falar que os buracos negros são objetos misteriosos, com uma propriedade chamada “simplicidade”. Essa palavra pode parecer estranha, pois, na física, a simplicidade de um buraco negro significa que, apesar de sua aparência complexa, seu comportamento e formação seguem regras bastante elegantes. Um exemplo clássico vem do próprio John Wheeler, que cunhou o termo “buraco negro” e brincou que eles não têm cabelo, ou seja, não têm características externas que possam ajudar a identificá-los facilmente. Essa “falta de cabelo” reflete a ideia de que, uma vez formado, um buraco negro é como uma bola lisa, difícil de distinguir de outros, a não ser por sua massa, spin (rotação) e carga — atributos que parecem desaparecer na sua simplicidade.
Porém, a ciência está agora revelando que essa aparente simplicidade não é um obstáculo, mas uma pista. Pesquisadores da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, publicaram na revista Physical Review Letters um estudo que usa ondas gravitacionais — essas ondulações no espaço-tempo previstas por Einstein — para entender como esses objetos formam suas origens. Essas ondas podem ser comparadas às ondas no oceano, mas no espaço, resultantes de eventos cósmicos extremos, como a fusão de dois buracos negros. Quando esses objetos se encontram, eles liberam uma quantidade imensa de energia, formando ondas que podemos “ouvir” com instrumentos sofisticados como LIGO e Virgo.
Ao analisar esses sinais, os cientistas descobriram um padrão interessante: o “spin” dos buracos negros — uma espécie de assinatura do seu movimento de rotação — muda de acordo com a massa do buraco negro. Essa mudança sugere que muitos buracos negros não se formaram apenas pelo colapso de uma única estrela, mas por uma série de colisões com outros buracos negros, formando uma espécie de cadeia de eventos. É como se uma bola de neve, ao rolar por uma encosta, fosse acumulando neve com cada rodada, crescendo e mudando seu movimento. Assim, os buracos negros maiores, que aparecem em colisões sucessivas, carregam um padrão de rotação diferente dos menores, que podem ter se formado de uma única estrela que morreu.
A descoberta mais empolgante é que essa mudança no padrão de rotação — ou seja, o “padrão de giro” — funciona como uma espécie de linha divisória. De um lado, há buracos negros menores, provavelmente formados por estrelas que morreram isoladamente. Do outro, os maiores, resultado de muitas colisões, que vivem em grupos densos de estrelas, chamados aglomerados estelares. Essa distinção ajuda os cientistas a entenderem a origem desses objetos de uma forma mais clara, sem depender de modelos teóricos complexos ou suposições difíceis de verificar.
Pensando de forma simples, é como se cada buraco negro tivesse uma “impressão digital” que revela sua história de formação. Essa inovação na análise de ondas gravitacionais torna possível identificar se um buraco negro se formou sozinho ou em uma cadeia de colisões, como uma assinatura de DNA cósmico. Essa habilidade de “ler” a história do buraco negro pelas suas ondas é uma revolução na astrofísica, pois oferece um novo paradigma para estudar esses objetos enigmáticos.
E o mais incrível é que esse método não depende de teorias complicadas, mas de observações diretas do universo. Assim como um arqueólogo que usa pegadas para reconstruir uma história antiga, os cientistas usam as ondas gravitacionais para montar o quebra-cabeça da formação dos buracos negros. Com isso, eles poderão, no futuro, entender melhor o universo, com suas galáxias, estrelas e, claro, esses misteriosos buracos negros que continuam a nos intrigar. Afinal, quanto mais aprendemos sobre suas origens, mais nos aproximamos de entender o universo em toda a sua complexidade e beleza.
Fonte: Como e onde os buracos negros se formaram? Estudo faz “DNA cósmico” – CNN Brasil | Link da fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/como-e-onde-os-buracos-negros-se-formaram-estudo-faz-dna-cosmico/