Imagine por um momento que a nossa mente é como um grande teatro, cheio de luzes, sons e atores que representam nossas experiências, memórias e percepções. Quando estamos bem vivos, esse teatro funciona de forma contínua, com todas as luzes acesas e o palco preparado para as nossas ações. Mas o que acontece quando a cortina começa a fechar, como em situações de risco de vida, ou até mesmo na hora da morte? É nesse momento que surgem as chamadas experiências de quase morte, aquelas visões vívidas, sensações de paz e até memórias intensas que algumas pessoas relatam.
Recentemente, uma equipe de pesquisadores desenvolveu um modelo inovador chamado Neptune, que tenta explicar essas experiências de uma forma mais científica e compreensível. Pense nele como um roteiro que mostra como o espetáculo do cérebro se ajusta diante de uma situação extrema, como uma queda de energia ou uma emergência médica. Essa teoria propõe que há uma série de eventos neurofisiológicos e psicológicos que acontecem de forma evolutiva, ou seja, que podem ter sido úteis para nossos ancestrais de alguma maneira.
Para entender melhor, podemos imaginar que, quando o cérebro sofre uma falta de oxigênio — como numa situação de asfixia ou trauma — ele começa a liberar uma combinação de neurotransmissores, que são como mensageiros químicos que transmitem sinais pelo sistema nervoso. Esses mensageiros, incluindo serotonina, endorfinas, dopamina e GABA, atuam como uma equipe de resgate, criando sensações de paz, visão de imagens vívidas, ou até uma sensação de estar desconectado do corpo. É como se o cérebro, diante do perigo, ativasse certos sistemas para proteger a pessoa, mesmo que ela esteja à beira da morte.
O mais fascinante é que essas experiências não são aleatórias ou meramente ilusórias. Elas parecem estar relacionadas a mecanismos evolutivos, os mesmos que encontramos em outros animais. Alguns animais, por exemplo, praticam a tanatose — um tipo de defesa que os faz parecer mortos para escapar de predadores — ativando os mesmos sistemas que, em humanos, podem desencadear uma experiência de quase morte. Isso sugere que essas sensações podem ter uma finalidade evolutiva, ajudando a proteger o cérebro e preparar o corpo para uma possível recuperação ou, no pior caso, uma morte inevitável.
O que torna tudo isso ainda mais intrigante é que, apesar de acreditarmos que, na hora da morte, a consciência se apaga, muitas pessoas relatam experiências ricas, vívidas e até transformadoras. Como explicar esse paradoxo? Segundo os cientistas, talvez o cérebro seja uma espécie de teatro que, mesmo em situações de desespero extremo, consegue manter uma atividade residual, uma última luz que ilumina o palco antes de apagar-se completamente.
Compreender esses mecanismos, como o modelo Neptune propõe, é como desvendar os bastidores de uma peça difícil, que revela como a nossa atividade cerebral se recupera e se adapta nos momentos finais. Isso não só amplia nossa compreensão sobre a morte, mas também levanta questões profundas sobre o que é a consciência e até onde ela vai além do corpo físico. Em última análise, ao estudar as experiências de quase morte, podemos descobrir mais sobre o que realmente somos e como nossa mente funciona, mesmo nos momentos mais extremos.
Fonte: Falta de oxigênio no cérebro pode explicar experiências de quase morte – Folha de S.Paulo | Link da fonte: https://www1.folha.uol.com.br/ciencia/2025/05/falta-de-oxigenio-no-cerebro-pode-explicar-experiencias-de-quase-morte.shtml